Ser Nadador (de Competição)

by - 13 dezembro


"Ser nadador (de Competição)"
Dias 14 e 15 de Dezembro realiza-se mais um Campeonato Nacional de Clubes da 2a Divisão de Natação. Para quem não sabe, é um evento em que se nadam as principais provas de todos os estilos. Cada equipa tem de colocar um nadador por prova e, consoante a respectiva classificação, dão um número de pontos para a equipa. No final, há uma classificação geral de equipas com o somatório de todas as provas e decide-se o campeão e, claro, quem sobe e desce de divisão. É um fim-de-semana muito intenso, repleto de emoção e que põe à prova cada nadador. Mas o que é, na verdade, ser-se nadador?
Para celebrar este evento que tantas vezes me marcou na vida, eis o que eu acho sobre esse tema:

Ser nadador é uma forma de estar, de ser, de viver.
Ser nadador é querer e muitas vezes não poder.
É, também, poder e ainda assim não conseguir.
É saber lidar com a frustração.
É saber lidar com a vitória.
É saber lidar com os treinos.
Ser nadador é acordar de madrugada, muitas vezes com a temperatura próxima dos zero graus, para se meter numa piscina que parece ainda mais fria. E ainda assim sorrir. E treinar como deve ser. E esforçar-se.
É saber que temos na nossa equipa uma família e no nosso treinador não só um amigo, mas também uma figura paternal cujos conselhos e reprimendas nos servem para a vida.
Ser nadador é treinar todos os dias. É treinar mais que uma vez por dia. É fazer centenas de horas de treino para melhorar apenas um centésimo de segundo numa prova, e dificilmente à primeira tentativa.
É saber que quando saltas para a piscina numa competição os teus adversários não são o principal alvo a abater, ou a ser ultrapassado. És tu próprio. Tu és o teu maior obstáculo.
Ser nadador é estar sempre numa guerra constante contra os próprios limites físicos e também mentais. Sim, mentais. Porque muitas vezes as competições e os recordes pessoais ganham-se na nossa cabeça.
Ser nadador é treinar mesmo que não apeteça. Principalmente se não apetecer. É nesses treinos que se cria a mentalidade de campeão.
Ser nadador é faltar a jantares, festas ou saídas com os amigos e não se importar com isso, porque sabemos que estamos a lutar pelos nossos objectivos. É adorar o cheiro a cloro. É comer imenso e ter fome a toda a hora. É ter sempre um fato de banho ou toalha a secar na casa de banho ou no carro. É habituarmo-nos ao cheiro da humidade que se impregna nas nossas coisas.
Ser nadador é saber passar por cima da ignorância dos amigos que acham que nadar é chapinhar na água e que é fácil, que não percebem por que razão damos tanta prioridade a algo que nos deixa frustrados tantas vezes, e que nos enche todo um fim-de-semana para nadarmos um minuto ou dois no total.
Ser nadador é ter um físico invejável e uma saúde de ferro.
Ser nadador é testar os limites constantemente. É ficar feliz por fazer perto do melhor tempo. É ficar frustrado por não bater o recorde pessoal. É ganhar por um centésimo de segundo. É perder por uma má braçada, no meio de tantas. É ter em atenção tantos detalhes que nem caberiam numa página.
Ser nadador é uma contínua construção de personalidade capaz de enfrentar o mundo lá fora como poucos conseguem. É ter uma mentalidade, resiliência e paixão que os outros não têm.
Ser nadador é celebrar o sucesso da equipa e arranjar motivação para ultrapassar os falhanços. É saber que se pode passar uma época inteira sem melhorar nenhum tempo e, mesmo assim, ser uma época extraordinária. É saber que com trabalho e dedicação conseguimos alcançar tudo o que pretendemos.
Ser nadador é amar e odiar nadar ao mesmo tempo.
Ser nadador é dar tudo. É gritar por dentro quando está a doer na alma e a ficar sem forças pelo esforço. É saber que um abraço ou um elogio do treinador ou colega vale a pena todo o sangue, suor e lágrimas. É saber que tens de te entregar totalmente se queres evoluir. É prestar atenção aos pormenores. É ir a máximo. Sempre.
Ser nadador é conciliar tudo isto com a vida académica e ter sucesso em ambas.
Ser nadador é ser especial.
Ser nadador é isto e muito mais. Muito mais, mesmo.
Ser ex-nadador é ter saudades de tudo isto. É saber que esse período nunca mais voltará. É saber que foi a melhor coisa que podia ter acontecido na vida. É tentar voltar a nadar a sério novamente, independentemente do tempo que tenha passado desde que deixámos a competição. É sentir falta de, depois de um dia cansativo de aulas, estarmos felizes por nos encontrarmos com a nossa segunda família, mesmo sabendo que isso implica esgotarmos as forças que nos restavam na piscina. 
É sentir um aperto no coração ao recordar os bons e os maus momentos que passámos em equipa. Cada peripécia, cada vitória, cada derrota. Tudo. Tudo traz uma enorme saudade.
Ser nadador é nunca deixar de o ser o resto da vida.
A todos os ex-nadadores, actuais nadadores e futuros nadadores: nadar é a melhor coisa do mundo. Por vezes, também é a pior. E não podíamos ser mais sortudos na vida por isso.
Parabéns por serem quem são.
Boas braçadas!

Bruno M Franco
(Ex-)Nadador do Clube Lisnave e CIRL.

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4 comentários

  1. Muito bom.
    É isso mesmo!
    Abraço
    (António Mendes)

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  2. É verdade, é tudo isto e provavelmente mais ainda.
    Espero que esteja tudo bem contigo. Abraço!

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  3. Transposição fiel do que é ser nadador. Mesmo acompanhando, quando possível, por fora posso comprovar que muitas horas e muito esforço foi, por ele, dedicado àquilo que mais gostava, a Natação. Madrugada escura, lá ia ele apanhar o autocarro, por vezes a correr, que parava aqui junto á porta. Escuro que nem breu, frio de rachar e lá seguia. Eu, da janela do meu quarto, via se ele apanhava o autocarro. Nunca foi preciso lá ir levá-lo. Gosto, força e dedicação estavam ali em bruto. Este alento foi a sua 'Estrela Polar' que sempre o norteou. Comprometido com os treinos e provas, pouco tempo teve para olhar, para as muitas vicissitudes que infelizmente cercam os nossos jovens de agora. Posso me gabar de nunca ter tido um problema com ele, neste tempo todo. Foi esse mesmo alento, que o fez um excelente aluno. Disciplinado na natação, foi fácil transportar esses métodos para a vida académica, e ai temos, hoje, um Técnico de Radioterapia. Do 1º ano até à Licenciatura nunca perdeu um ano escolar, o que muito me orgulhou. A vida dele nem sempre foi fácil, mas esta segunda família esteve á altura quando mais foi necessário e preciso. É com muito orgulho que escrevo estas linhas, na esperança de que ele consiga transmitir estas boas vivências aos seus vindouros. Um abraço forte.

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    1. Não foi fácil, mas as memórias que ficam são extraordinárias. Ir para a Natação foi das melhores coisas que me podiam ter acontecido na vida. Obrigado, pai.

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