by - 08 novembro




“HOJE VOU MORRER” - PARTE 4/5

Com as melhores intenções do mundo, preparei uma surpresa para o meu marido. No entanto, quem teve a surpresa fui eu.
Na sala de arrumos, estava nada mais, nada menos, que o meu marido a possuir uma mulher das limpezas. Estavam no chão, ela de pernas abertas e com a mão na boca para abafar os gemidos, ele a martelá-la com violência. Com o vigor que não tinha para mim. Só me lembrava dele assim no início da nossa relação.
Fiquei chocada, abalada, e percebi tudo. Percebi porque é que a vontade tinha diminuído. Ele andava a comer por fora. Comia antes de ir para casa, claro que não tinha fome para jantar comigo. Não consegui dizer nada. Apenas olhei nos olhos do meu marido metido dentro de outra e fechei a porta.
Nesse dia, não trabalhei. E foi naquele instante que, pela primeira vez, a ideia de suicídio me passou pela cabeça. Tantos anos investidos naquele homem, em termos um filho, para ele andar a comer outra durante o dia?
Senti-me estúpida. Senti-me como aquelas mulheres ingénuas dos filmes que nós dizemos que ela já devia ter adivinhado há mais tempo. Os sinais, realmente, estavam lá, mas nós nunca achamos que vai acontecer connosco. Como pude ser tão burra? COMO?
Cheguei a casa e, furiosa com a minha vida, atirei a roupa sexy para o lixo e fui procurar as coisas dele e atirar para o hall. Queria que ele saísse de casa. Não ia fazer como nos filmes em que atiram pela janela. Tinha de ter alguma dignidade. Atirei roupa, o computador, outros aparelhos, pastas que ele tinha e, uma dessas pastas, deixou cair alguns documentos de um hospital. Um que nunca tínhamos ido. Estranhei e li por alto cada um, até ter encontrado um documento que me deixou sem chão novamente. O que li deixou-me ainda mais furiosa, ainda mais indignada e estúpida.
Quando ele chegou a casa, receoso e com um ramo de flores enorme para fazermos as pazes, eu nem lhe perguntei do caso que estava a ter. O que tinha lido era tão grave que até se sobrepunha à sua traição. Perguntei sobre o documento que tinha encontrado. Era um tópico muito mais urgente.
- Com que então tu querias ter filhos comigo, meu cabrão? Como é que achavas que íamos ter filhos se fazíamos sexo sabendo que era impossível termos filhos?
- Querida…
- Tu fizeste uma vasectomia ainda antes de nos conhecermos! Não achavas que era de bom tom teres falado sobre isto comigo antes de nos casarmos?!
Não o deixei falar. Atirei-me a ele e arranhei-o, bati-lhe, mordi o que estava ao alcance, eu sei lá. Só o queria desfazer, só o queria matar.
Que mal teria eu feito para merecer isto? Ele saiu de casa e passei a viver sozinha, frustrada por saber que dificilmente iria ter filhos, algo que eu queria muito. Queria muito ser mãe. E aquele filho da mãe tirou-me esse sonho.
Senti-me suja, usada, velha.
Fiquei a saber, entretanto, que ele andara enrolado com a empregada no último ano e que, pelos vistos, um terço das mulheres que trabalhavam naquele edifício já lhe tinham passado pelas virilhas.
Os quatro anos seguintes foram uma sequência de más decisões. Demiti-me imediatamente quando me disseram que não me conseguiam transferir para outra sucursal do Banco. Não iria aguentar a vergonha de ver diariamente as minhas colegas e ficar a imaginar se olhavam para mim com condescendência, se iria ficar a tentar adivinhar quais tinham sido usadas pelo meu marido para me pôr um par de cornos. A vergonha era enorme, avassaladora. Nunca me sentira assim tão mal, tão envergonhada e humilhada.
Consegui emprego dois anos depois num Banco de menor poder, ganhava um terço do que antes e ia para a cama com homens cheios de más escolhas e que me usavam para terem prazer. Admito que, a certo ponto, também me deixava passar por ingénua para ter algum prazer sexual. Mas a vida deixara de fazer sentido. Já fizera os quarenta há alguns anos e sentia um vazio dentro de mim. Com a minha idade, não tinha esperança de conseguir ser mãe. Com esta idade, como poderia começar de novo? Como poderia encontrar o homem da minha vida? Como poderia, pelo menos, encontrar um homem decente que quisesse tentar ser pai comigo? Um homem que eu amasse verdadeiramente?
A conclusão era terrível.
A minha vida estava uma lástima. Não valia nada. Nunca poderia voltar a ser feliz. Entrei em depressão e, neste estado, uma ideia de finitude surgiu na minha mente com mais força. Mas, graças à presença da minha mãe, conseguia manter essas ideias horríveis afastadas o suficiente para evitar que elas me consumissem.
Mas por mais quanto tempo aguentaria?

Continua...

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